IBDFAM - É válido testamento particular com impressão digital como assinatura, decide STJ

IBDFAM - É válido testamento particular com impressão digital como assinatura, decide STJ

Um testamento particular que, mesmo não tendo sido assinado de próprio punho pela testadora, contou com a sua impressão digital, foi considerado válido pela Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça – STJ. Em decisão por maioria de votos, o colegiado entendeu que, nos processos sobre sucessão testamentária, o objetivo é a preservação da manifestação de última vontade do falecido, de modo que as formalidades legais devem ser examinadas à luz dessa diretriz máxima.

A controvérsia teve origem em ação para confirmar um testamento particular lavrado em 2013 por uma mulher em favor de uma de suas herdeiras. Em primeiro grau, o juiz confirmou a validade do testamento, sob o argumento de que não existia vício formal grave e que era válida a impressão digital como assinatura da falecida, diante do depoimento de testemunhas do ato, inclusive em relação à lucidez da testadora.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG reformou a sentença sob o fundamento de que a substituição da assinatura de próprio punho pela impressão digital faz com que o testamento não preencha todos os requisitos de validade exigidos pelo artigo 1.876 do Código Civil de 2002. Jurisprudência do STJ permite relativização de formalidades

Para a maioria dos ministros da Segunda Seção do STJ, as situações desta ordem deve ser analisada individualmente, para que se verifique se a ausência de alguma formalidade é suficiente para comprometer a validade do testamento, em confronto com os demais elementos de prova, sob pena de ser frustrado o real desejo do testador.

Relatora do caso, a ministra Nancy Andrighi explicou que a jurisprudência do STJ permite, excepcionalmente, a relativização de algumas das formalidades exigidas pelo Código Civil no âmbito do direito sucessório. As formalidades previstas no artigo 1.876 foram abrandadas, por exemplo, no REsp 701.917, no qual se admitiu, excepcionalmente, a relativização das exigências legais no tocante à quantidade de testemunhas para se reconhecer a validade do testamento particular.

"A regra segundo a qual a assinatura de próprio punho é requisito de validade do testamento particular traz consigo a presunção de que aquela é a real vontade do testador, tratando-se, todavia, de uma presunção juris tantum, admitindo-se a prova de que, se porventura ausente a assinatura nos moldes exigidos pela lei, ainda assim era aquela a real vontade do testador", destacou.

Vício formal

No caso em julgamento, a relatora ressaltou que não há dúvida acerca da manifestação de última vontade da testadora, que, embora sofrendo com limitações físicas, não tinha nenhuma restrição cognitiva. A fundamentação adotada pelo acórdão recorrido para não confirmar o testamento, a propósito, está assentada exclusivamente no referido vício formal, segundo Nancy Andrighi.

“Não controvertem as partes, ademais, quanto ao fato de que a testadora, ao tempo da lavratura do testamento, que se deu dez meses antes de seu falecimento, possuía esclerose múltipla geradora de limitações físicas, sem prejuízo da sua capacidade cognitiva e de sua lucidez”, observou a relatora.

Para a ministra, uma interpretação histórico-evolutiva do conceito de assinatura mostra que a sociedade moderna tem se individualizado e se identificado de diferentes maneiras, muitas distintas da assinatura tradicional. No atual cenário, a identificação pessoal tem sido realizada por tokens, logins, senhas e certificações digitais, além de sistemas de reconhecimento facial e ocular. Admite-se, inclusive, a celebração de negócios complexos e vultosos por meios virtuais.

Por essas razões, Andrighi enfatizou que “o papel e a caneta esferográfica perdem diariamente o seu valor”, devendo a real manifestação de vontade ser examinada em conjunto com os elementos disponíveis. Acesse o site do STJ para mais informações sobre o Recurso Especial 1.633.254 do STJ.

Herança digital e testamentos em vídeo

Entre as diversas repercussões da tecnologia no Direito das Sucessões, a herança digital, que inclui objetos de valor econômico ou mesmo sentimental dispostos no ciberespaço, foi destacada pelo advogado Marcos Ehrhardt Júnior em entrevista ao Boletim Informativo do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM divulgado nesta quinta-feira (16).

“Nos próximos anos, problemas envolvendo titularidade de criptomoedas, milhas aéreas e pontos em programas de fidelidade, acervo de livros e músicas digitais, além de controvérsias sobre a exploração econômicas de canais de vídeo e contas pessoais em redes sociais, devem se intensificar no Judiciário, que infelizmente, não parece estar preparado para lidar com toda a complexidade de tais situações”, avaliou o vice-presidente da Comissão de Família e Tecnologia do IBDFAM. Leia na íntegra.

Também em entrevista recente ao IBDFAM, o professor Gustavo Kloh Muller Neves apontou que os testamentos em vídeo devem crescer no Brasil por conta da pandemia do Coronavírus. Ele é autor do artigo científico sobre o tema, em que aborda a possibilidade de planejamento sucessório sob o prisma da boa-fé objetiva e da instrumentalidade das formas.

“Os testamentos em vídeo são lavrados em uma situação na qual a pessoa está no seu leito de morte, com um celular, por vezes em um hospital, e, nesses últimos momentos de vida, grava um vídeo no seu celular dizendo quais seriam suas posições de última vontade”, detalhou Gustavo. Saiba mais sobre o assunto.

Fonte: IBDFAM