Sobre o art. 169 da Lei de registros públicos (segunda parte)

(da série Registros sobre Registros n. 440)

                                                             Des. Ricardo Dip

1.252.   Prossigamos no breve exame do texto do art. 169 da Lei 6.015, começando nossa explanação pelo disposto no § 1º desse artigo: “O registro do loteamento e do desmembramento que abranger imóvel localizado em mais de uma circunscrição imobiliária observará o disposto no inciso II do caput deste artigo, e as matrículas das unidades imobiliárias deverão ser abertas na serventia do registro de imóveis da circunscrição em que estiver situada a unidade imobiliária, procedendo-se às averbações remissivas”.

           Com a segregação −ou, assim mais frequentemente se usa entre nós, o parcelamento− de um imóvel situado sob a competência de mais de um ofício imobiliário, autonomizam-se, juridicamente, as frações ou lotes resultantes da divisão. Daí que, por força da regra geral do caput do art. 169 –“Todos os atos enumerados no art. 167 desta Lei são obrigatórios e serão efetuados na serventia da situação do imóvel (…)”−, esses lotes propiciem a correspondente abertura de matrículas no âmbito de sua circunscrição e não mais como integrantes da gleba primitiva. Trata-se, pois, de uma aplicação do critério geral de competência para os registros e as averbações. Remanesce apenas, assim o impõe a lei com peculiar cautela, a prática de averbação remissiva nas matrículas referentes à gleba. Atenda-se ainda à possibilidade de um dos lotes situar-se geograficamente dentro do espaço competencial de mais de um ofício imobiliário, hipótese em que se aplica a exceção prevista no inciso II do caput do art. 169: “para o imóvel situado em duas ou mais circunscrições, serão abertas matrículas em ambas as serventias dos registros públicos”.

           Muito embora não se conte entre as funções tipológicas do registro de imóveis o subsídio burocrático de prestar informações à administração pública, é questão de política a atribuição −que se espera excepcional− de tarefas cartoriais atípicas, assim a que, por exemplo, consta do § 2º do art. 169 da Lei 6.015: “As informações relativas às alterações de denominação de logradouro e de numeração predial serão enviadas pelo Município à serventia do registro de imóveis da circunscrição onde estiver situado o imóvel, por meio do Serp, e as informações de alteração de numeração predial poderão ser arquivadas para uso oportuno e a pedido do interessado”. A excessividade na imposição de funções atípicas aos cartórios extrajudiciais −exageração que parece acorrer, em nossos tempos, ao registro civil brasileiro das pessoas naturais− é uma das notas que parecem marcar o tendencial declive administrativista adotado, entre nós, há mais de uma década.

           Por fim, apreciemos um tanto o que dispõe o § 3º do aqui versado art. 169:

“Na hipótese prevista no inciso II do caput deste artigo, as matrículas serão abertas:    

I - com remissões recíprocas;   

II - com a prática dos atos de registro e de averbação apenas no registro de imóveis da circunscrição em que estiver situada a maior área, averbando-se, sem conteúdo financeiro, a circunstância na outra serventia; e    

III - se a área for idêntica em ambas as circunscrições, adotar-se-á o mesmo procedimento e proceder-se-á aos registros e às averbações na serventia de escolha do interessado, averbada a circunstância na outra serventia, sem conteúdo financeiro.”

           Aqui se cuida, ainda uma vez, de uma regulação competencial. Trata-se da prática relativa a imóvel situado em duas ou mais circunscrições, quando, como visto, devam abrir-se matrículas nos registros imobiliários dentro em cuja competência territorial esteja localizado esse imóvel.

           A primeira previsão legal correspondente é a de que se proceda a averbações remissivas quando algum ato seja lançado em uma das várias matrículas. Se, com efeito, impõe-se a abertura de diferentes matrículas para contemplar a relação de territoriedade do imóvel com a diversidade competencial dos ofícios imobiliários, é coerente que em todas essas matrículas haja notícia das vicissitudes suportadas pelo imóvel. De não ser assim, não se justificaria a multiplicidade das matrículas.

           Todavia, ainda é preciso saber onde realizar os registros e as averbações que levam aos averbamentos remissivos previstos no inciso I do § 3º do art. 167.

           A lei, neste passo, indica dois critérios. O primeiro, presente a diversa proporção das áreas imobiliárias situadas nas diferentes circunscrições, hipótese em que os registros e as averbações devam praticar-se no ofício “em que estiver situada a maior área”, sem prejuízo da averbação na matrícula ou nas matrículas que haja em outro ou outros cartórios. Essa averbação remissiva deve atender a que seu objeto se repute “sem conteúdo financeiro”.

           O segundo critério diz respeito à equivalência –a lei fala em identidade− das áreas submetidas a diversa competência territorial: “se a área for idêntica em ambas as circunscrições, adotar-se-á o mesmo procedimento e proceder-se-á aos registros e às averbações na serventia de escolha do interessado, averbada a circunstância na outra serventia, sem conteúdo financeiro”.

           Aqui prevalece a eleição do interessado no ato registral, que pode escolher, pois, a qual cartório destinar o pedido de registro ou averbação, outra vez sem prejuízo de que seja “averbada a circunstância na outra serventia, sem conteúdo financeiro”.

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           Antes de encerrar esta exposição, parece bem referir brevemente ao curso que acaba de realizar-se na Universidade de Coimbra (entre 27 e 31 de outubro), sob o patrocínio do Cenor (Centro de Estudos Notariais e Registrais da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Centro de que é presidente a Professora Mónica Jardim), da Anoreg paranaense (Associação dos Notários e Registradores do Paraná, e lá esteve seu Presidente, Dr. Mateus Afonso Vido da Silva), da Emap (Escola da Magistratura do Paraná, ali representada pela Professora Mônica Maria Guimarães de Macedo Dalla Vecchia), e com o apoio da Academia Paranaense de Direito Notarial e Registral.

           O evento contou com a presença de magistrados, notários e registradores paranaenses, e prevê-se tenha sido, até pela excelência dos estudos ali realizados, o passo inicial de uma trajetória de aprofundamento da doutrina do notariado e dos registros públicos.

           Parabéns ao Paraná.