O vocábulo «autorização» –ação ou resultado de autorizar– parece ter origem próxima no verbo latino auctoro (auctoravi, auctorare, auctoratum; aprovar, conceder autorização ou consentimento, legalizar um documento -cf. Rodrigo Fontinha–; ou seja, neste último sentido: conferir a nota de autenticidade, fides publica, a documentos –vidē José Bono). Há quem o remeta (cf. Antônio Geraldo da Cunha), seguidamente, a auctoritas, atis, depois a auctor, auctoris, e, por fim, ao verbo augeo (auxi, augēre, auctum; aumentar, acrescentar). Mas não falta que Miguel Fernández Casado se incline à gênese autos + reos (= o que flui de si mesmo).
A expressão é de uso muito frequente nas leis. Se consideradas suas variações numéricas e de classe gramatical (autorização, autorizações, e as declinações do verbo autorizar), contam-se, p.ex., quase três dezenas dela no Código de processo civil brasileiro de 2015, e mais amplamente –ultrapassando a centena– no Código civil nacional de 2002. Também interessa ao direito administrativo, em que se destacam dois modos principais: o primeiro, o de ser um instrumento de controle prévio (rectius: preventivo), pelo qual um órgão faculta a outro a prática de um ato (cf. Roberto Dromi); o segundo modo, o pelo qual a administração “consente que o particular exerça atividade ou utilize bem público no seu próprio interesse” (Carvalho Filho).
O aspecto nodal da autorização é o predicado de superioridade pelo qual e do qual emana, em prol do interesse alheio, um quadro de confiança, ou de obediência, ou de crença, de respeito, etc. Disso vem que, examinando-se o tema da autorização notarial, que nela se avista um aumento ou acréscimo de valor em um documento, que, antes dessa autorização pelo notário, não suplantaria a característica de ser um projeto ou, quando muito, de um documento particular contanto que já estivesse firmado pelos outorgantes (cf. Giménez Arnau).
Dessa maneira, o conceito de autorização notarial acolhe a ideia de acréscimo de valor oriundo da circunstância de o notário sinalizar (i.e., firmar) o documento, porque detém a superioridade relativa –ou seja, a auctoritas– para essa sinalização (ou assinação) e, com ela, o predicado adicional da potestas fidei publicæ.
Embora essa superioridade seja funcional –ou, talvez melhor se diga: institucional–, não se deve com isso menoscabar a importância da pessoa mesma do notário, que é, em rigor, a derradeira chave da vitalidade do instrumento público. Juan Vallet de Goytisolo disse-o bem: “la institución notarial se basa en la persona del notario y en su labor, tal como históricamente se ha desarrollado”.
Num tempo como o atual, que é vistosas comichões tecnocráticas, não podemos menosprezar a ideia de que a fé pública, por definição política e itinerário histórico, é uma realidade fundamentalmente antropológica, destinada a comunicar algo de emitentes humanos (agentes fidei publica) a destinatários igualmente humanos (receptores da fé pública: fides publica accipientium), o que, tal ficou dito noutra parte, “inviabiliza a admissão de que um mero correlato epistêmico objetivo, tecnológico, possa ser a suficiente fonte emanante (fides publica agentis) ou causa eficiente (fides publica efficiens) substituinte da captação, da percepção e da comunicação inter homines”.
A essência mesma do notariado está na competência autorizadora do notário –ou seja, em sua auctoritas de jurista, primeiro, e, depois, de documentador. Em palavras de Bono, a fé pública resulta da autoridade que ordena a formalização documentária, e não do só fato da mera autenticação do documento por um funcionário ad hoc, ou ainda do simples fato material de o documento gerar-se e conservar-se num ambiente que se afirme tecnicamente seguro.
A superioridade institucional do notário –que, pois, alicerça a autorização notarial– não consiste na destreza técnica de um documentador, mas na virtude de um jurista experienciado na arte de determinar o justo negocial.