(da série Registros sobre Registros n. 422)
Des. Ricardo Dip
1.234. Conversão da Medida provisória 458, de 2009, a Lei 11.952, de 25 de junho do mesmo ano de 2009, alterou o texto dos arts. 167, 176 e 250 da Lei 6.015, de 1973:
«Art. 40. A Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, passa a vigorar com as seguintes alterações:
<Art. 167.
(…)
II –
(…)
do destaque de imóvel de gleba pública originária.>
<Art. 176.
(…)
§ 5º Nas hipóteses do § 3o, caberá ao Incra certificar que a poligonal objeto do memorial descritivo não se sobrepõe a nenhuma outra constante de seu cadastro georreferenciado e que o memorial atende às exigências técnicas, conforme ato normativo próprio.
§ 6o A certificação do memorial descritivo de glebas públicas será referente apenas ao seu perímetro originário.
§ 7o Não se exigirá, por ocasião da efetivação do registro do imóvel destacado de glebas públicas, a retificação do memorial descritivo da área remanescente, que somente ocorrerá a cada 3 (três) anos, contados a partir do primeiro destaque, englobando todos os destaques realizados no período>.»
Como se vê, o legislador instituiu uma nova categoria no gênero «segregação imobiliária»: o destaque de imóvel de gleba pública originária.
Consiste a segregação imobiliária −ou partição de imóvel, desfalque de área de imóvel, et reliqua− na autonomização jurídica de uma parte imobiliária subtraída de maior superfície. Essa autonomização separa uma porção de um todo, no qual, por evidente, permanece alguma quantidade de área (a que de comum se atribui o nome «remanescente»); mas deve atender-se ainda à possibilidade de essa autonomia logo se esgotar por uma sucessiva anexação a outro imóvel.
O tema em geral diz respeito ao relacionamento entre, de um lado, a unitariedade formal ou tabular e, de outro lado, a unitariedade substantiva dos imóveis, esta última, comumente estável, mas não de todo alheia de vicissitudes materiais e jurídicas que podem afetar essas ambas unidades.
Pois bem, pode compreender-se, por motivos de prudência legislativa, que se tenha assinado um novo nome para uma nova disciplina jurídica referente, contudo, a uma realidade material que não é nova. Todavia, em rigor, o conceito de «destaque de imóvel» é, no aspecto factual, comum a todas as espécies de segregação imobiliária, ou seja, ao loteamento, ao desmembramento, ao desdobro e, agora, ao destaque de imóvel público. Passam, então, a conviver, na linguagem jurídica o «destaque de imóvel» genérico (abrangendo todas as espécies de segregação) e o «destaque de imóvel» específico, referível às glebas públicas. Faltou pouco de imaginação para que se sugerisse algum outro nome para esse destaque específico.
Mas deixando de lado essa perspectiva apenas nomenclatória, instituiu-se uma disciplina jurídica nova, isto sim, para a segregação no patrimônio imobiliário público.
Com efeito,
• o loteamento que consiste, na dicção da Lei 6.766/1979 (de 19-12), na «subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes» (§ 1º do art. 2º), exige um dispendioso processo de elaboração de projeto, aprovação oficial e registro (arts. 12 e 18 et sqq. da mesma Lei 6.766);
• o desmembramento que, segundo a Lei 6.766, é «a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique na abertura de novas vias e logradouros públicos, nem no prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes» (§ 2º do art. 2º), reclama também aprovação municipal de seu projeto e o registro no ofício imobiliário (arts. 10, 12 e 18), embora, não raro, sem a mais exigente observância do previsto nos arts. 18 e 19 da mesma Lei 6.766;
• o desdobro, que é só o mesmo desmembramento com dispensa ordinária do processo habilitante de seu registro (i.e., o previsto nos arts. 18 e 19 da Lei 6.766, de 1979), também supõe aprovação municipal;
• enfim, abstraindo as hipóteses de separações naturais (avulsão, aluvião, etc.), a última espécie a considerar é a do destaque de imóvel de gleba pública originária, beneficiado no processo de registro imobiliário: «Não se exigirá, por ocasião da efetivação do registro do imóvel destacado de glebas públicas, a retificação do memorial descritivo da área remanescente, que somente ocorrerá a cada 3 (três) anos, contados a partir do primeiro destaque, englobando todos os destaques realizados no período» (§ 7º do art. 176 da Lei 6.015, incluído com a Lei 11.952).
Como ficou indicado, a normativa de regência não exige para a averbação do destaque de imóvel de gleba pública originária urbana a aprovação do município, nem, ainda, rural o imóvel público, audiência ou anuência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, bastando ao solicitante apresentar ao registro de imóveis competente a planta com as indicações do desfalque de área e o memorial descritivo.
Assim, insista-se, o registrador não deve exigir, a cada pleito de destaque de um mesmo imóvel, a descrição do remanescente, o que apenas caberá a cada três anos contados do primeiro desfalque de área.
Observou, entretanto e, a meu ver, com razão, o doutrinador mineiro Francisco José Rezende dos Santos, também oficial do registro de imóveis em Belo Horizonte, que, ainda nas hipóteses de destaque de imóvel de gleba pública, «o registrador imobiliário deve ficar atento às áreas mínimas permitidas para o parcelamento do solo, tanto urbanos quanto rurais» (in «Os dispositivos específicos aplicáveis ao desmembramento e à regularização dos imóveis da União»).