Aditamento

O termo aditamento, no direito notarial, tem, ordinariamente, o sentido mais próprio de adição, de acréscimo; retificação, primeiro e diretamente, de um documento notarial, remetendo-se ao ato a que esse documento corresponde. Mas compreende também, em algum caso, a ideia de confirmação ou roboração.

 

Entre as várias correções ou emendas que, ao menos de fato, podem afetar os instrumentos notariais –e, pois, ainda que de modo indireto, sejam aflitivos dos atos correspondentes–, a saber, p.ex., as apostilas, as entrelinhas, as raspaduras, as palavras intercaladas ou referidas por supressas (testados, palavras tachadas: palavras censuradas, emendadas), avulta, por sua maior segurança e quantidade, o aditamento, quer o lançado como cláusula no próprio documento ainda em trânsito e pendente da autorização notarial (por isto mesmo fala-se aí em cláusula aditiva), quer o expedido de modo posterior e em outro documento (adiunctus posterus ou aditamento em separado).

 

O vocábulo aditamento provém, proximamente, do substantivo neutro da segunda declinação latina additamentum, i, que tem o sentido primeiro de adição, aumento, acrescentamento (vidē Torrinha), mas também possui a acepção de acessório (Santos Saraiva). De modo mais remoto, deriva do verbo addo (infinitivo addere –cf. Antônio Geraldo da Cunha), de cujo gerúndio addendo, addendum resultou nosso vernáculo adendo: apêndice, suplemento, o que se acrescenta ao fim de um texto, escrito, documento, etc. É do latim ainda que veio, com sentido equivalente a adendo, nossa palavra adenda, cuja origem é o gerúndio plural addenda. Parece avistar-se que o prefixo ad de additamentum e do verbo addo indique a ideia de junção, incorporação, supressas as duas letras centrais de apud (junto de; assim, S.Isidoro de Sevilha, nas Etimologias).

 

Aparentará, de início, numa estrita consideração literal, que todo aditamento seja uma retificação positiva, um acréscimo. E isto é uma verdade, secundum quid. Ou seja, com o aditamento sempre haverá uma adição ou suplemento documentário –é dizer, um acréscimo no ou de documento; um appendix documenti, um addendo dicti. Mas isto não significa haja sempre, com o aditamento, um acréscimo no ato documento (addendo acti) ou mesmo um aumento na matéria exarada no documento (addendo materalis in documento). É que há aditamentos notariais com fins supressivos, seja de indicações reportadas ao actum, seja de referências só relativas ao texto (erros apenas de redação) do documento primitivo ou principal.  Ainda, pois, que, no aditamento, o acréscimo documental não possa estar ausente, isto é aumento no dictum, adição no (ou do) documentum, pode ocorrer que esse acréscimo seja para suprimir uma indicação quanto ao ato ou uma enunciação do dictum anterior.

 

Desta maneira, há, com o aditamento notarial, uma indispensável retificação positiva documentária, mas, quanto a seu conteúdo, o aditamento pode ser (i) emenda positiva (colmatando lacuna do documento –que se diz principal quando se trata de aditamento em separado), (ii)  negativa (corrigindo, supressivamente, circunstância do actum ou lapso do dictum do documento alterado), (iii)  retificação mista, supressora em parte e suplementar noutra, e, por fim, (iv) ser aditamento de roboração (appendix confirmationis), como se dá com os aditados de atualização em certidões.

 

O aditamento notarial pode ser protocolar (assim o deve ser, sempre, o das escrituras, que sempre se lançam nos livros matrizes) ou extraprotocolar, tal o das atas que sejam extravagantes desses livros –p.ex., as emendas em reconhecimentos de firma– ou o das certidões e traslados.

 

Acessório que sempre é e, pois, dependente, o aditamento incorpora-se ao documento principal –adere ou, mais exatamente, inere nesse documento–, fruindo da mesma eficácia sintética de sua fé e, quando o caso, do efeito analítico que corresponda ao capítulo retificado do instrumento capital.

 

Sublinhe-se, todavia, por muito importante, que o caráter acessório do aditamento impede, na hipótese de emenda por novo documento (ou seja, o additamentum posterus ou sanação posterior), que haja mudança substancial do actum; é dizer que, tratando-se de aditamento diverso do da cláusula aditiva, apenas se admitem retificações quanto aos acidentes do ato objeto do documento principal (sobremodo, trata-se aqui de erros materiais). Saber, contudo, quando se está diante de modificação substancial exige interpretação em cada caso, mas, em linha de princípio, não se permite o aditamento que altere indicações essenciais quanto à determinação dos bens objeto dos atos ou quanto às declarações de vontade dos clientes (por muitos, Carlos Pelosi e Natalio Etchegaray).

 

A falibilidade que é uma nota conatural no homem pós-adâmico torna impossível evitar de todo a necessidade de aditamento dos instrumentos notariais (Enrique Giménez-Arnau invoca, a propósito, esta gráfica expressão: “el mejor Escribano, echa un borrón”). Isto, porém, não deve inclinar a uma resignação passiva; disse muito bem Fernández Casado que o melhor é evitar a necessidade das emendas dos documentos notariais, “poniendo sumo esmero en la redacción y escritura de los contratos, pues aquéllas [as emendas] ofenden à la vista, dañan à la seriedad del documento y ocasionan siempr motivo de dudas y litigios”.

 

Por admitir-se propter officium, o aditamento, de comum, não exige rogação específica, nem outra recolha de firma que a do notário (ou um seu substituto). Caberá, no entanto, essa rogação –que deverá documentar-se– quando o aditamento –suposto se entenda viável– provenha de fonte notarial diversa da que produziu o documento originário. Esta mesma hipótese de admitir-se lavrar-se o aditamento por notário que não o autor do título emendado é muito controversa. Opinam alguns ser ela incabível, por uma espécie de prevenção competencial do notário de origem, que há de ser o juiz da evidência do erro e, não menos, também da evidência da emenda correspondente. Outros, cuja opinião é oposta, atraem a seu favor o tema da confiança do cliente, que a pode ter perdido exatamente pelo erro do primeiro notário e, pois, não pode constranger-se em neste próprio buscar a retificação do ato. De toda a sorte, se admitida, esta emenda –quando for de caráter protocolar–, deve anotar-se no livro do protocolo original, cabendo sempre ao notário que autorizou o documento de origem a expedição das certidões correspondentes.