A clássica adjudicatio romana, parte formulária das ações divisórias de coisas comuns (iudicia divisoria), resultava na atribuição de quinhões a seus comunheiros. Provendo a fórmula, o juiz conferia, por meio de sentença constitutiva, a cada um dos comproprietários, a quota que lhe tocasse na divisão. Também se adjudicavam coisas integrais de um patrimônio comum e, de não admitir a coisa comum uma divisão física, adjudicava-se ela a um dos comunheiros, imputando-se-lhe a obrigação de indenizar os demais.
Essa última hipótese de adjudicatio, correspondente à actio familiae erciscundae (ação divisória relativa à comunhão entre co-herdeiros), encontra abrigo, entre nós, no art. 2.019 do Código Civil de 2002: “Os bens insuscetíveis de divisão cômoda, que não couberem na meação do cônjuge sobrevivente ou no quinhão de um só herdeiro, serão vendidos judicialmente, partilhando-se o valor apurado, a não ser que haja acordo para serem adjudicados a todos. § 1º Não se fará a venda judicial se o cônjuge sobrevivente ou um ou mais herdeiros requererem lhes seja adjudicado o bem, repondo aos outros, em dinheiro, a diferença, após avaliação atualizada. § 2º Se a adjudicação for requerida por mais de um herdeiro, observar-se-á o processo da licitação”.
Com maior amplitude, falava-se em adjudicatio no ato de o juiz assinar a uma pessoa a propriedade de determinada coisa, origem de que proveio a atual adjudicação na via executória: os bens do devedor alienam-se diretamente ao credor à conta do crédito exequendo; dir-se-á —com impropriedade embora— dação em pagamento, dação em cumprimento: com efeito, uma dação a que não concorre a vontade do devedor não é propriamente dação, cuja disciplina, lê-se no Código civil brasileiro, é a das normas do contrato de compra a venda (art. 357), o que pressupõe contraia voluntariamente o vendedor a obrigação de transferir a outrem o domínio de certa coisa (art. 481). Também se disse, de modo gráfico, que a adjudicação é a venda, a credor, de bens penhorados (arts. 876 a 878 do Código brasileiro de processo civil de 2015), e, com efeito, é aí um ato expropriatório (inc. I do art. 825 do Cód.pr.civ., no plexo de uma execução forçada, no interesse e a requerimento do credor-exequente; pode sê-lo ainda por instância de credores quirografários concorrentes, havendo, pois, coexistência de penhora do mesmo bem e observadas as preferências (arts. 797, par.ún., 876, § 5º, 889, incs. II a VIII, 908 e 909 do Cód.pr.civ.), ou ainda de credores hipotecário ou pignoratício (inc. II do art. 904 do Cód.pr.civ.).
São requisitos dessa adjudicação no vigente Código de Processo Civil brasileiro: a legitimação do adjudicante (caput e §§ 5º e 6º do art. 876 do Cód.pr.civ.) e oferecimento de preço não inferior ao valor do bem penhorado (caput do art. 876 do Cód.pr.civ.; ver, contudo, o que dispõem o par.ún. do art. 24 da Lei 6.830, de 22-9-1908, e o art. 7º da Lei 5.741, de 1º-12-1971: “Não havendo licitante na praça pública, o Juiz adjudicará, dentro de quarenta e oito horas, ao exequente o imóvel hipotecado, ficando exonerado o executado da obrigação de pagar o restante da dívida”).
No que respeita à norma do art. 24 da Lei 6.830/’980, admite ela a adjudicação dos bens pela fazenda exequente tanto antes, quanto depois da hasta pública –leilão, praça ou, quando o caso, pregão da Bolsa de Valores. Se tardia, não havendo licitantes, é sempre caso de a fazenda pública adjudicar pelo preço da avaliação (arg. da alínea a do inc. II do mesmo art. 24), e não por quantum inferior. Esse art. 24 enuncia três possibilidades de a fazenda proceder, na ação executória, à aquisição forçada dos bens penhorados: (i) mediante adjudicação prévia, pelo preço da avaliação; (ii) finda a hasta, se que haja licitantes, também pelo preço da avaliação; (iii) se, com lanços, pelo valor da maior oferta. Não se previu, contudo, a hipótese de a exequente licitar sem concorrência e adquirir por preço inferior ao da avaliação (cf., a propósito, nos julgados do Superior Tribunal de Justiça: REsp’s 242.490, 45.385 e 741.776).
Há referências legislativas, entre nós, a diversas espécies de adjudicação; assim:
- art. 1.298 do Código civil, correspondente à actio finium regundorum: “Sendo confusos, os limites, em falta de outro meio, se determinarão de conformidade com a posse justa; e, não se achando ela provada, o terreno contestado se dividirá por partes iguais entre os prédios, ou, não sendo possível a divisão cômoda, se adjudicará a um deles, mediante indenização ao outro”;
- par.ún. do art. 1.322 do mesmo Código, relativamente à actio communi dividundo: “Quando a coisa for indivisível, e os consortes não quiserem adjudicá-la a um só, indenizando os outros, será vendida e repartido o apurado, preferindo-se, na venda, em condições iguais de oferta, o condômino ao estranho, e entre os condôminos aquele que tiver na coisa benfeitorias mais valiosas, e, não as havendo, o de quinhão maior”;
- art.1.418 ainda do Código civil de 2002, que prevê a adjudicação compulsória nas promessas de compra a venda: “O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel”;
- adjudicações inscritas em atos normativos esparsos (p.ex., arts. 15 e 63, § 3º, da Lei 4.591, de 16-12-1964; § 7º do art. 98 da Lei 8.212, de 24-7-1991; § 4º do art. 18 da Lei 9.393, de 19-12-1996; art. 360 do Decreto 3.048, de 6-5-1999).
Fala-se também em adjudicação na esfera do direito administrativo, conceituando-se “o ato formal da Administração que, pondo fim ao procedimento licitatório, «atribui» ao vencedor o objeto da licitação (Marçal Justen Filho; cf., a propósito, a Lei 8.666, de 21-6-1993, passim, e o art. 70 da Lei 4.320, de 17-5-1964: “A aquisição de material, o fornecimento e a adjudicação de obras e serviços serão regulados em lei, respeitado o princípio da concorrência”).
A adjudicação imobiliária é objeto de registro no ofício predial: quer em caso de sucessão mortis causa (art. itens 24 e 25 do inc. I do art. 167 da Lei 6.015/1973), quer quando se trate de adjudicação em hasta pública (n. 26 do inc. I do mesmo art. 167), instrumentando-se a adjudicatio por meio de carta de adjudicação(arts. 659, § 2º, e 877 do Cód.pr.civ.), expedida com observância do disposto no § 2º do mesmo art. 877: “A carta de adjudicação conterá a descrição do imóvel, com remissão à sua matrícula e aos seus registros, a cópia do auto de adjudicação e a prova de quitação do imposto de transmissão”.
Releva para o registro da adjudicação de imóvel hipotecado observar a norma do art. 1.501 do Código civil brasileiro de 2002: “Não extinguirá a hipoteca, devidamente registrada, a arrematação ou adjudicação, sem que tenham sido notificados judicialmente os respectivos credores hipotecários, que não forem de qualquer modo partes na execução”.