Apostilamento

           Os substantivos portugueses apostilamento e apostila, bem como o verbo apostilar derivam do latim post illa (Laudelino Freire, Antônio Geraldo da Cunha). Também são do português as palavras apostilha e apostilhar –que o Vocabulário oficial da língua portuguesa (Volp) registra–; usou-se também apostília, que já não se elenca no Volp.

 

Ordinariamente, a preposição post rege-se pelo acusativo: post Christum natum (depois do nascimento de Cristo), post hominum memoriam (desde tempos imemoriais) –esses exemplos são de Van den Besselaar, no Propylaeum latinum.

 

Essa construção latina post illa, no entanto, se pode sugerir a construção regular com a regência acusativa, de modo que o pronome demonstrativo illa corresponderia ao neutro plural do caso acusativo de illus, illa, illud, não exclui a possibilidade –mas isto seria, reconheça-se, de todo excepcional– da regência ablativa da preposição post.  Com efeito, há alguns exemplos de advérbios latinos compostos pela preposição post com o uso do ablativo: postea, posthac –em seguida, depois (Torrinha); trata-se do ablativo de medida, que só se usa por força de uma comparação entre pessoas ou coisas; pode aventurar-se, portanto, que o post illa observe a mesma razão de comparar-se um antes e um depois: assim, non multo post, multo post (exemplos de Napoleão Mendes de Almeida), em que o adjetivo multus, multa, multum está no ablativo singular.

 

Se essa última conjectura for de admitir, tem-se então de indagar por qual motivo se usou post illa, e não post ille (masculino) ou post illud (neutro). Talvez porque traduza a ideia de post rem (ou post re, com ablativo: depois de alguma coisa, em seguida a alguma coisa), e res é palavra feminina no idioma latino.

 

Apostilamento é tanto a ação, quanto o ato de apostilar, de fazer ou produzir apostila, de lançar algo à margem de um documento –à “margem de uma escritura” (Laudelino Freire)–, de aditar um diploma ou título oficial (Id.): addition faite en marge d’un écrite, d’une lettre (Le petit Robert, verbete apostille); um post scriptum, enfim. E com esse sentido de “em seguida, após, depois de”, a apostila, no direito administrativo, é o ato de mera enunciação ou “declaratório de uma situação anterior criada por lei” (Hely Lopes Meirelles).

 

A palavra apostila –com o sentido restrito de resenha de lições ministradas (p.ex., as apostilas do Liceu deram origem a alguns livros de Aristóteles)– tornou-se de moda, no Brasil, para referir, nos termos da Convenção (de Haia) sobre a Eliminação da Exigência de Legalização de Documentos Públicos Estrangeiros (5-10-1961),  a anotação, selo ou carimbo que, com modelo específico e emanando de autoridade competente, lança-se em documento para certificar-lhe a autenticidade; o jargão de turno exprime com essa apostila o escopo de “legalizar” documentos para que tenham efeito em Países subscritores da “Convenção de Haia; lê-se na segunda parte do art. 2º dessa Convenção: “… legalização significa apenas a formalidade pela qual os agentes diplomáticos ou consulares do país no qual o documento deve produzir efeitos atestam a autenticidade da assinatura, a função ou o cargo exercidos pelo signatário do documento e, quando cabível, a autenticidade do selo ou carimbo aposto no documento”.

 

O Brasil aprovou essa convenção em 6 de julho de 2015 (Decreto legislativo 148), promulgando-a pelo Decreto 8.660/2016 (de 29-1).