Recentremos nossa atenção no processo de registro predial do bem de bem de família.
Os três primeiros passos do itinerário registral do bem de família são o (i) da apresentação do título (escritura pública, formal de partilha, carta de adjudicação), o (ii) de sua prenotação −ou seja, seu apontamento no livro n. 1 -protocolo do registro imobiliário e (iii) o de sua autuação.
A apresentação −prescrita no art. 261 da Lei 6.015/1973: “Para a inscrição do bem de família, o instituidor apresentará ao oficial do registro a escritura pública de instituição…”− é o que corresponde à rogação, requerimento, solicitação, pedido de registro. A apresentação não necessita ser escrita, nem possui uma fórmula sacramental; é bastante o fato de entregar-se o título ao cartório imobiliário. Essa apresentação −ato inaugural do processo de registro do bem de família− distingue-se de uma outra apresentação do título, que se destina a sua qualificação registral e ao cálculo de despesas (lê-se no par.ún. do art. 12 da mesma Lei 6.015: “Independem de apontamento no Protocolo os títulos apresentados apenas para exame e cálculo dos respectivos emolumentos”).
A prenotação ou protocolização do título (art. 182 da Lei 6.015: “Todos os títulos tomarão, no Protocolo, o número de ordem que lhes competir em razão da sequência rigorosa de sua apresentação”) constitui um direito posicional no registro (dada a prioridade que dela resulta: cf. art. 186 da Lei 6.015) e define o tempo inicial da eficácia da inscrição definitiva (art. 1.246 do Código civil de 2002: “O registro é eficaz desde o momento em que se apresentar o título ao oficial do registro, e este o prenotar no protocolo), prevalecendo, no capítulo do registro do bem de família, até o final do processo (vidē art. 264 da Lei 6.015).
A autuação é, formalmente, o ato inicial de um processo. Na língua portuguesa o substantivo auto é uma variante do vocábulo ato; ambos derivam do latim actus, acti (ou ainda actus, actus) ꟷe não do grego autos (αυτός) de que parece resultar também o vernáculo auto em certas palavras: autodidata, autônomo, automotor etc. A gênese latina traduz, prima facie, a ideia de solenidade: tenha-se em conta, a título ilustrativo, a referência aos autos de fé, nome com que se designavam os processos nos Tribunais de Inquisição; ao lado, porém, dessa vertente jurídica −ou seja, de algum rito ou solenidade do direito−, há também a referência a autos teatrais, a cerimônia ou solenidade de uma “ação artística, sacra ou profana, executada por corpos vivos” ꟷLanciani-Tavani; assim, os célebres autos do grande literato português que foi Gil Vicente (1465-1536). Em sentido material, a autuação consiste em dar uma capa à peça inaugural de um processo, e nessa capa indicar elementos de sua identificação (nome do interessado, objeto, data etc.; cf. De Plácido e Silva), servindo o conjunto autuado de locus de convergência das demais peças que, sucessivamente, interessarem a esse mesmo processo, cujas folhas se vão numerando em ordem consecutiva.
Com a satisfação desses três passos −a saber, apresentação do título, prenotação e autuação−, cabe ao oficial do registro a qualificação do título, ou seja, a tarefa de decidir singularmente se cabe ou não admitir a inscrição pleiteada, decisão qualificadora que deve emitir-se à luz dos requisitos extrínsecos e intrínsecos da titulação, bem como à vista de sua harmonia com os supostos registrais (p.ex., observância da consecutividade tabular, da regularidade da descrição do imóvel em face do registro anterior, etc.).