Consciência do Notário e Consciência do Registrador (parte 23)

EXCURSO AO TEMA DA CONSCIÊNCIA DO NOTÁRIO E DA CONSCIÊNCIA DO REGISTRADOR: A EDUCAÇÃO DOS CONCURSANTES (parte 7)

Na série de degraus para atingir as virtudes intelectuais da ciência e da sabedoria, o último patamar é a contemplação (contemplatio), degrau supremo na ascensão ao conhecimento da verdade.

Tanquerey diz que contemplar é, em geral, "olhar um objeto com admiração", e, depois de dividir a contemplatio em natural e sobrenatural, redivide aquela −a natural− em sensível, imaginativa e intelectual.

Contemplação sensível é a admiração que radica no sentido externo da visão; contemplar sensivelmente é, pois, de maneira própria, a visão admirada de algo (p.ex., olhar por longo tempo e com admiração o céu muito estrelado, a imensidão do mar, a elevação de grandes montanhas, a beleza de uma flor, etc.). Só em sentido análogo, seria possível falar em admiração da sonoridade de determinadas músicas; assim, alguém dirá que contempla pela audição uma obra de Haydn. 

A contemplação imaginativa dá-se ao representar-se longamente e com admiração, por meio do sentido interno da imaginação −com o subsídio da memória−, um acontecimento, uma coisa ou até uma pessoa, pondo nisto admiração e afeto. 

Por fim, a contemplação intelectual −também dita filosófica− é aquela em que se detém o intelecto com admiração e sem necessidade de raciocinar acerca de uma verdade. Garrigou Lagrange conceitua essa contemplação, como "simples visão intelectual da verdade, acima do raciocínio e acompanhada de admiração". Uma simples visão, a exemplo da simples apreensão que é a primeira das operações intelectuais, significa algo direto, sem médio (ou seja, sem o meio do raciocínio). Ao dizer-se que essa visão da contemplatio está "acima do raciocínio" quer afirmar-se que ela já dispensa a argumentação, mas não se nega, ao menos sempre, que essa dispensa se tenha dado in radice. Com efeito, pode haver contemplações intelectuais infusas, mas, de comum, essas contemplações intelectivas são adquiridas e têm à origem o exercício da razão, que, em seu momento consumativo, essas contemplações podem, no entanto, superar.

Assim, quando nos dedicamos a ler −com a atenção devida−, a meditar sobre o que lemos, a pedir as luzes para bem compreendermos, preparamo-nos para o derradeiro degrau da ciência (ou da sabedoria) correspondente, quando já não precisamos mais do que lançar uma vista ao objeto, sem necessidade de raciocínios, para admirar a verdade que lhe diga respeito.

Pois bem: estamos até aqui tratando da contemplação natural, que, em sua espécie intelectiva ou filosófica, é o objetivo último da educação. Todavia, além dessa contemplatio natural, outra há que diz respeito às coisas divinas, a "contemplação das coisas do alto" (Hugo de São Vítor).

Essa contemplação das coisas divinas constitui um grau infinitamente superior à contemplação natural, porque situa as verdades todas sob a perspectiva de Seu Criador.